31 de dez. de 2013

A Criança Divina - Claudio Naranjo


Um dos aspectos do infantil é aquele que já mencionamos: uma retidão intrínseca, uma sabedoria natural, um valor privado de existência, trazido para o mundo ao invés de resultar dele, uma qualidade de atenção ou de “estar ali”, o que é um direito inato do homem, mas que ele com muita freqüência perde. Quaisquer que sejam os valores que a criança apresente, são inseparáveis do nosso ser. São os valores da nossa origem na natureza. “As coisas propriamente infantis” não são mais do que expressões não distorcidas deles, suas manifestações não veladas.
Assim a criança representa algo que no homem é sua origem, sua base, seu ser mais intrínseco, uma essência que a cultura esconde. E a atitude infantil é uma atitude da confiança na própria natureza, aceitando como verdadeiro a retidão básica da vida, em vez de assumir que a vida é um erro para ser corrigido através de esforços (...). A Criança Divina - Claudio Naranjo

O Rebelde

Rebelde é aquele que não reage contra a sociedade, é aquele que compreende todo o jogo e simplesmente cai fora dele. O jogo passa a não fazer sentido para ele.

Ele não é contra o jogo. E essa é toda a beleza da rebelião: trata-se de liberdade.

O revolucionário não é livre. Ele está o tempo todo lutando contra algo - como pode haver liberdade na reação?

Liberdade significa compreensão. A pessoa compreende o jogo e, ao ver que ele é um modo de impedir a alma de crescer, um modo de não permitir alguém de ser quem é, ele simplesmente o abandona sem que ele deixe marcas na sua alma. A pessoa perdoa e esquece, seguindo em frente sem nada que a prenda à sociedade em nome do amor ou em nome do ódio.

A sociedade simplesmente desaparece para o rebelde. Ele pode viver no mundo ou pode sair dele, mas não pertence mais a ele; é um forasteiro.

Osho - Liberdade - A Coragem de Ser Você Mesmo

Nisargadatta Maharaj - Despertar Para o Eterno


29 de dez. de 2013

Osho – Encontro Com Pessoas Notáveis

Gurdjieff tem apenas um ensinamento para seus discípulos, que é o de não se identificar. Toda sua escola, suas técnicas, seus métodos e situações baseiam-se num único fundamento que é este: não se identificar. (...)

Lembre-se do centro! Observe seu comportamento, seus atos, suas identificações e estará estabelecida uma distância; logo vai se criando uma distância – o observador e aquele que faz tornam-se dois. Você poderá se ver rindo, chorando, caminhando, comendo, fazendo amor; poderá fazer muitas coisas, o que quer que aconteça a seu redor – e permanecerá como um observador. Não mergulha para se fundir com o que quer que esteja vendo. (...)

O seu ser interior é exatamente como um espelho. O que quer que passe a sua frente ele reflete, tornando-se simplesmente uma testemunha.  Venha a doença ou a saúde, a fome ou a saciedade, o verão ou o inverno, a infância ou a velhice, o nascimento ou a morte – o que quer que aconteça, acontece diante do espelho, mas nunca AO espelho.
É isso a ausência de identificação, o corte pela raiz, na própria raiz – para se tornar um espelho.

Osho – Encontro Com Pessoas Notáveis

6 de ago. de 2012

27 de jul. de 2012

14 de jun. de 2012

G. I. Gurdjieff


Lembre-se de você mesmo, sempre e em toda parte. G. I. Gurdjieff

3 de jun. de 2012

Psicologia da Meditação - Claudio Naranjo


O alerta correto recupera, para o homem, a pérola perdida de sua liberdade, arrancando-o das fauces do Dragão Tempo. O alerta correto libera o homem dos grilhões do passado, que ele estupidamente tenta reforçar, olhando para trás frequentemente com olhar de saudade, ressentimento ou remorso. O alerta correto evita que o homem se prenda a temores e esperanças imaginários, à antecipação de acontecimentos futuros. Assim, o alerta correto devolve ao homem uma liberdade que só pode ser encontrada no presente. Nyaponika Thera

Psicologia da Meditação - Claudio Naranjo

13 de dez. de 2011

A liberdade da auto-identificação

"Maharaj: Você pode sentar no chão? Precisa de uma almofada? Tem qualquer pergunta a fazer? Não é que você necessite perguntar, você pode também ficar quieto. Ser, só ser, é importante. Você não precisa perguntar, nem fazer nada. Tal modo aparentemente preguiçoso de passar o tempo é altamente considerado na Índia. Significa que, no momento, você está livre da obsessão do “e agora?”. Quando você não tem pressa e a mente está livre da ansiedade, ela se torna tranqüila e, no silêncio, algo pode ser ouvido, o qual é ordinariamente muito tênue e sutil para ser percebido. A mente deve estar aberta e serena para ver. O que estamos tentando fazer aqui é trazer nossas mentes para dentro do estado adequado ao entendimento do que é real.

P: Como podemos reduzir nossas preocupações?

M: Você não necessita preocupar-se com suas preocupações. Apenas seja. Não tente estar tranqüilo; não faça do “estar tranqüilo” uma tarefa a ser realizada. Não se inquiete a respeito de “estar tranqüilo”, angustiado por “ser feliz”. Simplesmente, seja consciente de que você é, e permaneça consciente – não diga “sim, eu sou; e agora?” Não há um “e agora?” no “eu sou”. É um estado eterno.

P: Se for um estado eterno, ele se expressará de qualquer modo.

M: Você é o que é, eternamente, mas de que lhe serve isto a menos que você o conheça e saiba agir de acordo? Sua tigela de mendigo pode ser de puro ouro, mas, enquanto você não souber disto, será um miserável. Você deve conhecer seu valor interno e confiar nele, e expressá-lo no diário sacrifício do desejo e do medo.

P: Se eu me conhecesse, não deveria desejar ou temer?

M: Durante algum tempo, os hábitos mentais podem demorar-se apesar da nova visão – o hábito de desejar o passado conhecido e temer o futuro desconhecido. Quando você souber que estes só pertencem à mente, poderá ir além deles. Enquanto tiver todo o tipo de idéia sobre si mesmo, conhecer-se-á através da névoa destas idéias; para conhecer-se tal com é, abandone todas as idéias. Não pode imaginar o sabor da água pura, só pode descobri-lo abandonando todos os sabores.

Enquanto estiver interessado em seu modo atual de vida, você não o abandonará. O descobrimento não poderá vir, enquanto você estiver aderido ao familiar. Só quando você compreender plenamente a imensa aflição de sua vida, e se rebelar contra ela, poderá encontrar a saída.

P: Posso ver agora que o segredo da vida eterna da Índia está nestas dimensões da existência das quais a Índia sempre teve a custódia.

M: É um segredo aberto e sempre houve pessoas querendo, e dispostas a distribuí-lo. Mestres, há muitos; discípulos corajosos, muito poucos.

P: Estou desejoso de aprender.

M: Aprender palavras não é o bastante. Você pode conhecer a teoria, mas sem a experiência real de si mesmo como o impessoal e não qualificado centro de ser, amor e bem-aventurança, o mero conhecimento verbal será estéril.

P: Então, o que faço?

M: Tente ser, apenas ser. A palavra mais importante é “tentar”. Destine tempo suficiente a cada dia para sentar-se quietamente e tentar, apenas tentar, ir além da personalidade com seus vícios e obsessões. Não pergunte como, não pode ser explicado. Siga tentando até ser bem sucedido. Se perseverar, não poderá haver fracasso. O que interessa no grau máximo é a sinceridade, a seriedade; deve estar farto de ser a pessoa que é, e ver a urgente necessidade de libertar-se desta desnecessária auto-identificação com um punhado de recordações e hábitos. Esta firme resistência contra o desnecessário é o segredo do êxito.

No final das contas, você é o que é a cada momento de sua vida, mas nunca é consciente disto, exceto, talvez, no momento de acordar do sono. Tudo quanto necessita é ser consciente do ser, não como uma afirmação verbal, mas como um fato sempre presente. A Consciência que você é abrirá os seus olhos para o que você é. É tudo muito simples. Em primeiro lugar, estabeleça um contato constante consigo mesmo, esteja consigo mesmo todo o tempo. Todas as bênçãos fluem da Consciência. Comece como um centro de observação, de conhecimento deliberado, e torne-se um centro de amor em ação. “Eu sou” é uma pequena semente que se tornará uma poderosa árvore – de forma totalmente natural, sem um traço de esforço.

P: Vejo tanto mal em mim mesmo. Não devo mudar isto?

M: O mal é a sombra da falta de atenção. Na luz da Consciência, ele secará e cairá.

Toda dependência de outro é fútil, pois o que os outros podem dar, outros levarão. Apenas o que é seu no princípio permanecerá seu ao final. Não aceite orientação exceto de dentro e, mesmo então, examine bem todas as lembranças, pois elas o enganarão. Mesmo que desconheça os caminhos e os meios, fique quieto e olhe para dentro de si mesmo; a orientação, seguramente, virá. Você nunca é deixado sem conhecer que próximo passo deverá dar. O problema é que você pode evitá-lo. O Guru está aí para dar-lhe coragem, devido à sua experiência e realização. Mas só aquilo que você descobre através de sua própria Consciência, seu próprio esforço, será de uso permanente para você.

Lembre-se, nada do que você percebe é seu. Nada de valor vem a você do exterior; apenas seu próprio sentimento e entendimento são relevantes e reveladores. Palavras ouvidas, ou lidas, apenas criarão imagens em sua mente, mas você não é uma imagem mental. Você é o poder da percepção e da ação por trás e além da imagem.

P: Parece que você me aconselha a centrar-me em mim mesmo ao ponto do egoísmo. Não devo render-me a meu interesse pelas outras pessoas?

M: Seu interesse nos outros é egoísta, em interesse próprio, orientado para si mesmo. Você não está interessado nos outros como pessoas, mas só na medida em que eles enriquecem ou enobrecem sua própria imagem de si mesmo. E o maior egoísmo é cuidar apenas da proteção, preservação e multiplicação do próprio corpo. Por corpo quero dizer tudo o que está relacionado com seu nome e forma – sua família, tribo, país, raça, etc. O egoísmo é estar apegado à forma e ao nome. Um homem que sabe que não é nem corpo nem mente não pode ser egoísta, pois não tem nada por que ser egoísta. Ou, você pode dizer que é igualmente “egoísta” em benefício de todos aqueles que encontra; o bem-estar de todos é o seu bem-estar. O sentimento “eu sou o mundo, o mundo sou eu mesmo” torna-se totalmente natural; uma vez que isto esteja estabelecido, não haverá modo de ser egoísta. Ser egoísta significa invejar, adquirir, acumular em benefício da parte e contra o todo.

P: Pode-se ser rico e com muitas posses por herança ou matrimônio, ou simplesmente boa sorte.

M: Se você não se aferrar a elas, serão levadas de você.

P: Em seu estado presente, pode amar outra pessoa como pessoa?

M: Eu sou a outra pessoa, a outra pessoa sou eu mesmo; em nome e forma somos diferentes, mas não há separação. Na raiz de nosso ser, nós somos um.

P: Não é assim toda vez que há amor entre pessoas?

M: É, mas não são conscientes disto. Elas sentem a atração, mas não conhecem a razão.

P: Por que o amor é seletivo?

M: O amor não é seletivo, o desejo é seletivo. No amor não há estranhos. Quando o centro do egoísmo não existe mais, todos os desejos de prazer e temor da dor cessam; não se está mais interessado em ser feliz; além da felicidade está a pura intensidade, a energia inesgotável, o êxtase de dar de uma fonte perene.

P: Não devo começar resolvendo por mim mesmo o problema do certo e do errado?

M: O que é agradável, as pessoas tomam por bom, e o que é doloroso é tido por mau.

P: Sim, é assim, para nós, pessoas comuns. Mas como é para você, no nível da unidade? O que é bom e o que é mau para você?

M: O que aumenta o sofrimento é mau e o que o remove é bom.

P: De modo que você não considera bom o sofrimento em si mesmo. Há religiões em que o sofrimento é considerado bom e nobre.

M: O karma, ou destino, é a expressão de uma lei benéfica; o universal tende ao equilíbrio, à harmonia e à unidade. A cada momento, aquilo que acontece agora é no sentido do melhor. Pode parecer doloroso ou feio, um sofrimento amargo e sem sentido, mesmo assim, considerando o passado e o futuro, é para melhor, a única saída de uma situação desastrosa.

P: Sofre-se apenas pelos próprios pecados?

M: Sofre-se junto com o que se acredita ser. Se você se sentir um com a humanidade, você sofrerá com ela.

P: E, posto que você pretende ser um com o universo, não há limite no tempo e no espaço para seu sofrimento!

M: Ser é sofrer. Quanto mais estreito for o círculo de minha auto-identificação, mais agudo o sofrimento causado pelo desejo e pelo medo.

P: O Cristianismo aceita o sofrimento como purificador e enobrecedor, enquanto o Hinduísmo o olha com desgosto.

M: O Cristianismo é uma maneira de juntar palavras e o Hinduísmo é outra. O real é, por trás e além das palavras, incomunicável, diretamente experimentado, explosivo em seus efeitos sobre a mente. É facilmente obtido quando não se quer nada mais. O irreal é criado pela imaginação e perpetuado pelo desejo.

P: Pode haver sofrimento que seja necessário e bom?

M: A dor acidental, ou casual, é inevitável e transitória; a dor deliberada, infligida inclusive com a melhor das intenções, é absurda e cruel.

P: Você não castigaria o crime?

M: A punição não é senão crime legalizado. Na sociedade construída sobre a prevenção em vez da retaliação, haveria poucos delitos. As poucas exceções seriam tratadas medicamente, como mente e corpo enfermos.

P: Parece que você tem pouco emprego para a religião.

M: O que é a religião? Uma nuvem no céu. Eu vivo no céu, não nas nuvens, as quais são muitas palavras unidas. Elimine a verbosidade e o que permanece? A verdade permanece. Meu lar está no imutável, o qual parece ser o estado de constante reconciliação e integração dos opostos. As pessoas vêm aqui para aprender sobre a existência real de tal estado, sobre os obstáculos a seu surgimento e, uma vez percebido, sobre a arte de estabelecê-lo na consciência, de modo que não haja choque entre o entendimento e o viver. O próprio estado está além da mente e não é necessário aprendê-lo. A mente pode apenas focar os obstáculos; ver um obstáculo como obstáculo é eficaz, porque é a ação da mente sobre a mente. Comece do início; dê atenção ao fato de que você é. Em nenhum momento você pode dizer “eu não fui”, tudo o que pode dizer é: “Não recordo”. Você sabe quão incerta é a memória. Aceite que, preocupado com mesquinhos assuntos pessoais, esqueceu o que é; trate de recuperar a memória perdida mediante a eliminação do conhecido. Não se pode falar a você sobre o que vai acontecer, nem tampouco é desejável; a antecipação criará ilusões. Na busca interior, o inesperado é inevitável; o descobrimento está invariavelmente além de toda a imaginação. Do mesmo modo que uma criança ainda não nascida não pode conhecer a vida depois do nascimento, pois não tem em sua mente nada para formar uma imagem válida, assim também a mente é incapaz de pensar no real em termos de irreal exceto mediante a negação: “Isto não, aquilo não”. A aceitação do irreal como real é o obstáculo; ver o falso como falso, e abandoná-lo, traz a realidade para dentro do ser. Os estados de total claridade, amor imenso, coragem completa, são meras palavras no momento, perfis sem cor, sinais do que pode ser. Você é como um homem cego esperando ver depois de uma operação – desde que você não a evite! No estado em que estou, as palavras não interessam de forma alguma. Nem há qualquer dependência delas. Só importam os fatos.

P: Não pode haver nenhuma religião sem palavras.

M: As religiões documentadas são meros montes de verbosidade. As religiões mostram seu verdadeiro rosto na ação, na ação silenciosa. Para saber no que o homem acredita, observe como ele age. Para a maioria das pessoas, o serviço a seus corpos e mentes é sua religião. Podem ter idéias religiosas, mas não agem de acordo com elas. Brincam com elas, muitas vezes sentem-se muito orgulhosas delas, mas não agirão de acordo com elas.

P: As palavras são necessárias para a comunicação.

M: Para a troca de informações, sim. Mas a comunicação real entre as pessoas não é verbal. Para estabelecer e manter uma relação afetuosa, requer-se uma Consciência expressa na ação direta. Não o que você diz, mas o que faz é que importa. As palavras são fabricadas pela mente e só são significativas no nível mental. Não pode comer nem viver da palavra “pão” que, meramente, comunica uma idéia. Ela adquire significado apenas com a refeição real. No mesmo sentido, estou lhe falando que o Estado Normal não é verbal. Posso dizer que é o amor sábio expresso na ação, mas estas palavras transmitem pouco, a menos que você as experimente em toda sua plenitude e beleza.

As palavras têm sua utilidade limitada, mas não pôr nenhum limite a elas nos leva à beira do desastre. Nossas nobres idéias estão elegantemente equilibradas por ações desprezíveis. Nós falamos de Deus, Verdade e Amor, mas, em lugar de experiências diretas, nós temos definições. Em vez de aumentar e aprofundar a ação, nós cinzelamos nossas definições. E imaginamos que conhecemos o que podemos definir!

P: Como se pode transmitir a experiência senão por palavras?

M: A experiência não pode ser transmitida através de palavras. Vem com a ação. Um homem cuja experiência é intensa irradiará confiança e coragem. Outros também agirão, e ganharão a experiência nascida da ação. O ensinamento verbal tem sua utilidade, prepara a mente para esvaziar-se de suas acumulações.

Um nível de maturidade mental é alcançado quando nada externo é de algum valor e o coração está pronto para abandonar tudo. Então o real tem uma oportunidade e a aproveita. Os atrasos – se houver algum – são causados pela mente que se recusa a ver ou a descartar.

P: Estamos tão totalmente sós?

M: Oh, não! Não estamos. Aqueles que têm podem dar. E tais doadores são muitos. O próprio mundo é um presente supremo, mantido por um amoroso sacrifício. Mas, os adequados receptores, sábios e humildes, são poucos. “Pedi e será dado” é a lei eterna.

Tantas palavras você tem aprendido, tantas você tem dito. Você conhece tudo, mas não a si mesmo. Porque o ser não é conhecido através de palavras – apenas a percepção direta o revelará. Olhe dentro de si mesmo, busque no interior.

P: É muito difícil abandonar as palavras. Nossa vida mental é uma corrente contínua de palavras.

M: Não é questão de fácil ou difícil. Você não tem alternativa. Ou você tenta, ou não. Depende de você.

P: Tentei muitas vezes e fracassei.

M: Tente novamente. Se continuar tentando, alguma coisa poderá acontecer. Mas se você não tentar, estará preso. Você pode conhecer todas as palavras adequadas, citar as escrituras e ser brilhante em suas discussões e, mesmo assim, continuar sendo um saco de ossos. Ou pode ser discreto e humilde, uma pessoa totalmente insignificante, todavia resplandecente de amorosa bondade e profunda sabedoria."

Eu Sou Aquilo - Conversações com Sri Nisargadatta Maharaj

editoraadvaita.blogspot.com/2010/08/liberdade-da-auto-identificacao.html

28 de nov. de 2011

14 de nov. de 2011

Jiddu Krishnamurti



Nisargadatta - O Supremo, a Mente e o Corpo

Pergunta: Pelo que nos disse, parece que você não é totalmente consciente de seu ambiente. A nós, você parece extremamente desperto e ativo. Nós não podemos talvez acreditar que esteja em um tipo de estado hipnótico que não deixa vestígio de nenhuma recordação. Pelo contrário, sua memória parece excelente. Como entenderemos sua afirmação de que o mundo e tudo o que ele encerra não existe, no que toca a você?

Maharaj: É tudo uma questão de foco. A sua mente está enfocada no mundo; a minha está focada na realidade. É como a lua à luz do dia – quando o sol brilha, a lua quase não é visível. Ou observe como você se alimenta. Enquanto o alimento estiver na boca, você estará consciente dele; uma vez engolido, já não o interessará mais. Seria problemático tê-lo constantemente na mente até que fosse eliminado! A mente, normalmente, teria que estar em suspensão – a atividade incessante é um estado mórbido. O universo funciona por si mesmo – sei disto. O que mais necessito saber?

P: De modo que um gnani sabe o que está fazendo apenas quando presta atenção; de outro modo, ele simplesmente atua, sem se preocupar.

M: O homem médio não é consciente de seu corpo como tal. Ele é consciente de suas sensações, sentimentos e pensamentos. Mesmo estes, uma vez que se estabeleça o desapego, afastam-se do centro da consciência e acontecem espontaneamente e sem esforço.

P: Então, o que está no centro da consciência?

M: Isto a que não se pode dar nome e forma, já que não tem qualidades e está além da consciência. Você pode dizer que ele é um ponto na consciência, o qual está além da consciência. Como um buraco no papel, o qual está no papel e, ao mesmo tempo, não está no papel, assim o estado supremo está no próprio centro da consciência e ao mesmo tempo além dela. É como se fosse uma abertura na mente através da qual a mente seria inundada de luz. A abertura não é sequer a luz. É simplesmente uma abertura.

P: Uma abertura é simplesmente o vazio, a ausência.

M: Isso mesmo. Do ponto de vista da mente, é apenas uma abertura para que a luz da Consciência entre no espaço mental. Por si mesma, a luz só pode ser comparada a uma massa de Consciência pura que é sólida, densa, como uma rocha, homogênea e imutável, livre de padrões mentais de nome e forma.

P: Há alguma conexão entre o espaço mental e a morada suprema?

M: O supremo dá existência à mente. A mente dá existência ao corpo.

P: E o que há além?

M: Dando um exemplo. Um venerável iogue, um mestre na arte da longevidade, com mais de mil anos de idade, vem me ensinar sua arte. Eu respeito e admiro sinceramente seus êxitos e, ainda assim, tudo o que posso dizer a ele é: De que me serve a longevidade? Estou além do tempo. Por muito duradoura que seja a vida, é apenas um momento e um sonho. Do mesmo modo, estou além de todos os atributos. Eles aparecem e desaparecem em minha luz, mas não podem descrever-me. O universo é todas as formas e nomes, baseado em qualidades e diferenças, enquanto eu estou além de tudo isto. O mundo existe porque eu sou, mas eu não sou o mundo.

P: Mas você está vivendo no mundo!

M: Isso é o que você diz! Sei que existe um mundo, o qual inclui este corpo e esta mente, mas não os considero mais ‘meus’ que outras mentes e outros corpos. Eles estão aí, no tempo e no espaço, mas eu sou atemporal e ilimitado.

P: Mas, já que tudo existe por sua luz, você não seria o criador do mundo?

M: Eu não sou nem a potencialidade nem a atualização, nem a realidade das coisas. Em minha luz, elas vão e vêm como partículas de pó dançando no raio de sol. A luz ilumina as partículas, mas não depende delas. Nem se pode dizer que as criou. Nem sequer se pode dizer que as conheça.

P: Estou lhe fazendo uma pergunta e você está respondendo. Você está consciente da pergunta e da resposta?

M: Na realidade, não estou escutando nem respondendo. No mundo dos eventos, a pergunta e a resposta acontecem. Nada acontece para mim. Tudo simplesmente acontece.

P: E você é a testemunha?

M: O que a testemunha significa? Mero conhecimento. Choveu e agora a chuva acabou. Não me molhei. Sei que choveu, mas não fui afetado. Somente testemunhei a chuva.

P: O homem totalmente realizado, que mora espontaneamente no estado supremo, parece comer, beber e tudo o mais. Ele é consciente disto, ou não?

M: Isto no qual a consciência acontece, a consciência universal ou mente, nós chamamos o éter da consciência. Todos os objetos da consciência formam o universo. O que está além de ambos, apoiando-os, é o estado supremo, um estado de quietude e silêncio absolutos. Quem quer que vá ali desaparece. As palavras ou a mente não podem alcançá-lo. Você pode chamá-lo Deus, ou Parabrahman, ou Realidade Suprema, mas estes nomes são dados pela mente. É o estado sem nome, sem conteúdo, sem esforço e espontâneo, além do ser e do não ser.

P: Mas se segue sendo consciente?

M: Assim como o universo é o corpo da mente, a consciência é o corpo do supremo. Ela não é consciente, mas dá origem à consciência.

P: Em minhas ações diárias, muitas coisas ocorrem por hábito, automaticamente. Eu estou consciente do propósito geral, mas não de cada movimento em detalhe. À medida que minha consciência se amplia e aprofunda, os detalhes tendem a retirar-se, deixando-me livre para as tendências gerais. Não acontece o mesmo para um gnani, e ainda mais?

M: No nível da consciência – sim. No estado supremo, não. Este estado é inteiramente um e indivisível, um único e sólido bloco de realidade. O único modo de conhecê-lo é sê-lo. A mente não pode alcançá-lo. Para percebê-lo, não se requer o uso dos sentidos; para conhecê-lo, não é necessária a mente.

P: Assim é como Deus conduz o mundo.

M: Deus não está administrando o mundo.

P: Então, quem o faz?

M: Ninguém. Tudo ocorre por si mesmo. Você está fazendo a pergunta e dando a resposta. E você conhece a resposta quando faz a pergunta. Tudo é um jogo na consciência. Todas as divisões são ilusórias. Você só pode conhecer o falso, o verdadeiro você mesmo deve sê-lo.

P: Há a consciência testemunhada e a consciência que testemunha. É a segunda a suprema?

M: Existem as duas – a pessoa e a testemunha, o observador. Quando as vê como um, e vai além, você está no estado supremo. Ele não é perceptível, pois é o que torna possível a percepção. Está além do ser e do não ser. Não é nem o espelho nem a imagem no espelho. É o que é – a realidade atemporal, incrivelmente dura e sólida.

P: O gnani – ele é a testemunha ou o Supremo?

M: Ele é o Supremo, certamente, mas também pode ser visto como a testemunha universal.

P: Mas continua sendo uma pessoa?

M: Quando você acredita ser uma pessoa, vê pessoas em todas as partes. Na realidade não há pessoas, apenas fios de recordações e hábitos. No momento da realização, a pessoa tem um fim. A identidade permanece, mas a identidade não é uma pessoa, é inerente à própria realidade. A pessoa não tem nenhuma existência em si mesma; ela é um reflexo na mente da testemunha, o ‘Eu sou’, que novamente é um modo de ser.

P: O Supremo é consciente?

M: Nem consciente nem inconsciente. Digo-o por experiência.

P: Pragnanam Brahma.O que é Pragna?

M: É o conhecimento que não é autoconsciente da própria vida.

P: É vitalidade, energia de vida, vivacidade?

M: A energia vem em primeiro lugar. Pois tudo é uma forma de energia. A consciência está mais diferenciada no estado de vigília. Um pouco menos no sonho. Ainda menos no sono profundo. É homogênea – no quarto estado. Além, está a inexpressável realidade monolítica, a morada do gnani.

P: Cortei a mão. Já sarou. Que poder a fez sarar?

M: O poder da vida.

P: O que é esse poder?

M: É consciência. Tudo é consciente.

P: Qual é a origem da consciência?

M: A própria consciência é a origem de tudo.

P: Pode existir vida sem consciência?

M: Não, nem consciência sem vida. Ambas são uma. Mas, na realidade, só o Supremo é. O resto é questão de nomes e formas. E, enquanto se aferrar à ideia de que apenas o que tem forma e nome existe, o Supremo lhe parecerá não existente. Quando entender que os nomes e as formas são cascas vazias sem nenhum conteúdo seja qual for, e que o real não tem nome nem forma, que é pura energia de vida e luz de consciência, então estará em paz – imerso no profundo silêncio da realidade.

P: Se o tempo e o espaço forem meras ilusões e você está além, diga-me, por favor, que tempo faz em Nova Iorque. Faz calor ou está chovendo?

M: Como poderia falar para você? Tais coisas necessitam treinamento especial. Ou simplesmente viajar até Nova Iorque. Eu posso estar muito seguro de estar além do tempo e do espaço e, ao mesmo tempo, ser incapaz de localizar-me à vontade em algum ponto do tempo e do espaço. Não tenho suficiente interesse; não vejo nenhum propósito em seguir um treinamento ióguico especial. Simplesmente ouvi falar de Nova Iorque. Para mim, é uma palavra. Por que teria que conhecer mais do que encerra a palavra? Cada átomo pode ser um universo, tão complexo como o nosso. Tenho que os conhecer todos? Poderia – se treinasse.

P: Ao fazer a pergunta sobre o tempo em Nova Iorque, onde cometi o erro?

M: O mundo e a mente são estados de ser. O supremo não é um estado. Ele penetra todos os estados, mas não é um estado de outra coisa. É inteiramente sem causa, independente, completo em si mesmo, além do tempo e do espaço, da mente e da matéria.

P: Por que sinal o reconhece?

M: Esta é a questão, ele não deixa rastro. Não há como reconhecê-lo. Deve ser visto diretamente, abandonando toda a busca de sinais e aproximações. Quando forem abandonados todos os nomes e formas, o real estará com você. Não necessita buscá-lo. A pluralidade e a diversidade são apenas o jogo da mente. A realidade é uma só.

P: Se a realidade não deixasse evidência, não se poderia falar sobre ela.

M: A realidade é. Não se pode negá-la. Ela é profunda e obscura, um mistério além do mistério. Mas ela é, enquanto tudo mais meramente acontece.

P: É o Desconhecido?

M: Está além de ambos, o conhecido e o desconhecido. Mas eu o chamaria mais conhecido que desconhecido, pois, quando algo é conhecido, é o real que é conhecido.

P: O silêncio é um atributo do real?

M: Isto também é da mente. Todos os estados e condições são da mente.

P: Qual é o lugar do samadhi?

M: Não fazer uso da própria consciência é samadhi. Você simplesmente deixou a mente em paz. Você não quer nada, nem do corpo nem da mente.


Eu Sou Aquilo - Conversações com Sri Nisargadatta Maharaj